quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Anna Karenina

Clássico do cinema estrelado pela atriz Vivien Leigh. A história é baseada na literatura russa, no famoso livro escrito por Liev Tolstói. No enredo Stefan e Dolly Oblonsky aparentemente formam um casal feliz, mas por baixo dessa fachada as brigas são constantes. Para contornar a situação conjugal complicada Stefan entra em contato com Anna Karenina (Leigh), sua irmã, para ir até Moscou. Na viagem entre São Petersburgo e Moscou, Karenina acaba conhecendo outro casal, a condessa e o conde Vronsky. O que começa como uma simples amizade no trem em que viajam, acaba virando algo mais entre Karenina e o coronel e conde russo. Gostei dessa adaptação cinematográfica do best-seller. É uma produção inglesa que teve grande repercussão em seu lançamento por causa da bela presença da atriz Vivien Leigh, na época ainda colhendo os frutos de seu grande filme, "E o Vento Levou". A atriz surge em cena com os cabelos levemente cacheados, bem escurecidos, em figurino e joias de luxo, além de seu habitual carisma e talento. A direção parece perdidamente apaixonada por ela, pois o filme tem longos planos focando apenas seu rosto em close, usando belamente a fotografia em preto e branco para contrastar seu belo rosto iluminado com um fundo escuro e misterioso. O único brilho que surge no meio da escuridão é a de seu colar de diamantes e pedras preciosas. Um belo efeito que dá um toque muito sensual e glamoroso ao filme em si.

O enredo é clássico, mas há uma tentativa de transformar o perigoso caso de amor em uma ode ao sentimento proibido, seja pelas convenções sociais, seja pelos valores morais e religiosos. No final as mais românticas vão ficar devidamente satisfeitas pois o filme tem drama, romance e também cenas de bailes, com roupas da época e muito luxo. Tudo embalado em muito romantismo à moda antiga. Para o público masculino a sessão também valerá a pena, pois chegará à conclusão de que a Vivien Leigh era realmente uma graça, como atriz e como personalidade.

Anna Karenina (Anna Karenina, Inglaterra, 1948) Estúdio: London Film Productions / Direção: Julien Duvivier / Roteiro: Jean Anouilh, Guy Morgan, baseados na obra de Leo Tolstoy / Elenco: Vivien Leigh, Ralph Richardson, Kieron Moore / Sinopse: Adaptação do famoso livro da literatura russa que recria a era da sociedade daquele país nos tempos da dinastia Romanov.

Pablo Aluísio.


segunda-feira, 25 de setembro de 2023

Lawrence da Arábia

Esse filme é a obra prima absoluta do diretor David Lean, um dos melhores cineastas da história do cinema. Também é o auge, o ponto máximo da carreira do ator Peter O'Toole, um pico que ele nunca mais alcançaria em sua vida. São vários os adjetivos usados para essa produção realmente memorável. Grandioso, épico, maravilhoso, o cinema em sua mais qualificada essência, etc. De fato é um filme impressionante, uma produção que custou milhões de dólares e foi extremamente complicada de concluir. Também é grande em duração, com quase 230 minutos de duração. O cinéfilo precisa praticamente se preparar para encarar um filme assim, tão longo e ao mesmo tempo tão espetacular.

O curioso é que tudo estava pronto para Marlon Brando estrelar o filme. O roteiro foi pensado nele e o ator já tinha até mesmo concordado em analisar o convite, só que na última hora ele desistiu. O motivo foi frívolo. Brando afirmou que David Lean levava tanto tempo para filmar que ele provavelmente iria morrer seco no meio do deserto. Foi uma pena, mas ao mesmo tempo uma jogada do destino, porque atualmente ninguém consegue imaginar o personagem histórico sendo interpretado por outro ator. Peter O'Toole fez um trabalho tão fantástico que ele ficou para sempre marcado como o Lawrence da Arábia. E ao seu lado, no elenco, não faltaram outros nomes geniais como Alec Guinness, Anthony Quinn e Omar Sharif . Ou em outros termos, o filme também trazia a nata dos grandes atores da época.

Hoje em dia a figura de T.E. Lawrence é mais controversa do que quando o filme foi lançado. Esse inglês foi de tudo um pouco, arqueólogo, militar, agente secreto, diplomata. Para a mentalidade atual revisionista ele seria apenas um personagem a mais no jogo de dominação colonial do império britânico no Oriente Médio. Essa visão progressista mais crítica porém não se sustenta muito em meu ponto de vista. Até porque ele também foi um excelente escritor. Basta ler poucas linhas de seu mais conhecido livro, "Os Sete Pilares da Sabedoria", para bem entender isso. Porém deixando de lado essa visão mais política, o fato inegável é que o filme "Lawrence of Arabia" é mesmo cinema em seu estado mais grandioso, em sua mais pura essência. Um dos maiores clássicos da história do cinema de todos os tempos. Maior até mesmo que seu próprio protagonista.

Lawrence da Arábia (Lawrence of Arabia, Inglaterra, 1962) Direção: David Lean / Roteiro: Robert Bolt / Elenco: Peter O'Toole, Alec Guinness, Anthony Quinn, Omar Sharif, José Ferrer / Sinopse: O filme conta a história real do oficial britânico Thomas Edward Lawrence (1888 - 1945), um homem que teve grande importância no período colonial do império britânico no Oriente Médio. Filme vencedor do Oscar nas categorias de Melhor Filme, Melhor Direção (David Lean), Melhor Trilha Sonora (Maurice Jarre), Melhor Edição (Anne V. Coates), Melhor Som (John Cox), Melhor Direção de Arte (John Box, John Stoll, Dario Simoni) e Melhor Fotografia (Freddie Young).

Pablo Aluísio. 


domingo, 24 de setembro de 2023

As Sandálias do Pescador

O filme “As Sandálias do Pescador” foi baseado no best-seller de Morris L. West, um dos romancistas mais prestigiados do mundo. Em plena guerra fria, o enredo mesclava política e religião com muita maestria. A trama do filme era pura ficção, mas com nuances baseados em fatos históricos reais. No enredo o protagonista se chama Kiril Lakota (Anthony Quinn), Ele é um cardeal russo que acaba sendo libertado após muita pressão internacional contra o governo comunista da União Soviética. Exilado, ele volta ao Vaticano onde por uma ironia do destino acaba fazendo parte do conclave para a escolha do novo Papa. Como se não bastasse a surpresa de retornar a Roma nesse momento particularmente delicado, acaba ainda por cima sendo eleito o novo Papa pelos cardeais, que cansados das lutas internas dentro da cúria romana decidem eleger alguém de fora para assumir o poder máximo da Igreja Católica no mundo!

A história parece familiar para você? Pois é, incrivelmente parecida mesmo com a história do Papa João Paulo II, que também foi eleito após escapar do regime comunista na Polônia. Nesse ponto o autor Morris West foi incrivelmente perspicaz pois os eventos narrados em seu livro acabaram de certa forma se tornando reais dez anos depois com a escolha de Karol Wojtyla para o trono do pescador. É incrível pensar que ele havia previsto uma década antes que um novo Papa viria de um país dominado pelo comunismo. Era algo impensado na época, justamente por causa da guerra fria que parecia não ter fim. A eleição de um Papa proveniente de um país socialista seria algo não apenas inédito, mas também explosivo do ponto de vista da política internacional. Em meio a tensão, ter um Papa com essas origens iria deixar o cenário ainda mais turbulento e tenso entre Estados Unidos e União Soviética.

“As Sandálias do Pescador” é nitidamente dividido em dois atos. O primeiro que antecede a subida ao trono de São Pedro e o segundo que já mostra o protagonista como o novo Papa eleito. A produção é das mais ricas, com tudo sendo recriado a perfeição em seus menores detalhes. Todos os rituais, liturgias e cerimônias são refeitas com extremo rigor e fidelidade histórica. O elenco é fabuloso. Além de Anthony Quinn como o russo que vira Papa o filme ainda conta com as preciosas atuações de Laurence Olivier (como o premie soviético) e Vittorio de Sica como o Cardeal Rinaldi. Outro ponto positivo é a recriação das intrigas e conspirações palacianas, tão comuns em escolhas de Papas ao longo da história. Embora o filme decaia um pouco em seus momentos finais, o fato é que “As Sandálias do Pescador” é um marco do cinema da década de 60. Uma produção de encher os olhos com um elenco realmente maravilhoso. Em tempos de conclaves, eleições de Papas e tudo mais “As Sandálias do Pescador” se torna ainda mais interessante. Assistindo ao filme você irá perceber que pouco coisa mudou em todos esses anos. Os corredores do Vaticano e seus segredos milenares continuam os mesmos, seja na ficção ou na vida real. São dois mil anos de uma fonte inesgotável de história. 

As Sandálias do Pescador (The Shoes of the Fisherman, Estados Unidos, Itália, 1968) Direção: Michael Anderson / Roteiro: John Patrick, James Kennaway baseados no livro de Morris West / Elenco: Anthony Quinn, Laurence Olivier, Oskar Werner, Vittorio de Sica / Sinopse: Após escapar do regime brutal soviético um cardeal russo (Anthony Quinn) acaba sendo eleito o novo Papa com o nome de Kiril I. Filme indicado ao Oscar nas categorias de de melhor Trilha Sonora original e melhor Direção de Arte.

Pablo Aluísio. 

sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Marty

Com um roteiro sensacional nas mãos, o diretor americano Delbert Mann (Vidas Separadas), deu vida à "Marty", produção de baixo orçamento e que acabou arrebatando 4 Oscars, entre eles o de melhor filme. Marty conta a história de um açougueiro italiano, simples, honesto e bonachão (Ernest Borgnine) que vive para o trabalho e para sua mãe com quem mora numa simples e ampla casa. Apesar de todas as qualidades morais, Marty é questionado e pressionado por todos, até pela mãe - uma italiana tradicional que luta pelo casamento e pela preservação da família como instituição básica da sociedade - pelo fato de ainda não ter se casado, já que está com (pasme) 34 anos. No fundo, Marty tem vergonha de si mesmo, com baixa de auto-estima, se martiriza por não ter um emprego de mais "status" social, além de ser gordo, tímido, inseguro e feio. Destituído de atributos físicos mais atraentes e marcado por um passado azarado com as mulheres, o açougueiro bondoso e atencioso vai, cada vez mais, recolhendo-se silenciosamente em casa e se isolando do mundo lá fora. Vendo-se pressionado de forma implacável diariamente pela mãe para se casar, Marty passa a frequentar, mesmo contra a vontade, uma espécie de clube de dança onde a paquera frenética domina o ambiente barulhento e enfumaçado.

Acontece que numa determinada noite no tal clube, Marty conhece Clara (Betsy Blair - ex mulher de Gene Kelly), jovem sofrida com a dor de ter sido abandonada pelo namorado que a achava um bagulho. Com sua enorme bondade, Marty ampara a moça em seu sofrimento de abandono e aos poucos vai percebendo que uma força (quase) divina faz com que o casal se conheça, se aproxime e compartilhe os mesmos problemas de timidez, baixa auto-estima e insegurança. Marty agora luta contra o preconceito de todos pelo fato de sua nova namorada ser feia. O longa é uma primazia de fotografia em preto e branco e direção onde o diretor Delbert Mann conduz uma narrativa, focada na solidão de Marty e em elementos quase revolucionários, não lineares e que quebra certos paradigmas. Marty nos coloca diante de valores rígidos da década de 50, onde era quase inadmissível um homem levar uma vida de solteiro mais longeva e feliz, sem a interferência danosa de toda uma sociedade e até da própria família. Convenhamos, uma realidade bem diferente dos dias de hoje, pouco mais de 60 anos depois do filme. Marty abocanhou 4 Oscars: Melhor filme - Melhor diretor (Delbert Mann)  - Melhor ator (Ernest Borgnine)  - Melhor roteiro adaptado.

Marty (Marty, Estados Unidos, 1955) Direção: Delbert Mann / Roteiro: Paddy Chayefsky / Elenco: Ernest Borgnine, Betsy Blair, Esther Minciotti, Karen Steele / Sinopse: O filme narra a vida de Marty Piletti (Ernest Borgnine), um bom homem que acaba sofrendo preconceito por nunca ter se casado, se culpando por causa de sua condição social. Pressionado por todos, ele acaba conhecendo Clara (Betsy Blair) que pode se tornar finalmente o grande amor de sua vida. Filme premiado pelo Globo de Ouro e BAFTA Awards na categoria de Melhor Ator (Borgnine).

Telmo Vilela Jr.

quinta-feira, 21 de setembro de 2023

O Titã dos Ares

Título no Brasil: O Titã dos Ares
Título Original: China Clipper
Ano de Lançamento: 1936
País: Estados Unidos
Estúdio: Warner Bros
Direção: Ray Enright
Roteiro: Frank WeadNorman Reilly Raine
Elenco: Pat O'Brien, Humphrey Bogart, Beverly Roberts, Marie Wilson, Joseph Crehan, Addison Richards

Sinopse:
O filme conta a história real de um pioneiro da aviação chamado Dave Logan. Após o voo realizado por Lindbergh, ele se sentiu inspirado a criar sua própria companhia de aviação que iria levar correspondência e cargas entre os continentes. E sua ambição não encontra limites quando planeja uma rota em direção à China, ao distante Oriente. 

Comentários:
O mundo e o futuro pertencem aos visionários. Esse filme é interessante porque resgata a história desse pioneiro do mundo da aviação que ousou sonhar com rotas comerciais regulares de aviões cruzando os oceanos Atlântico e Pacífico, algo que naquela época era visto como uma loucura, pois os aviões não tinham toda essa autonomia de voo. Além de ser muito arriscados, voos tão longos com aviões ainda não plenamente desenvolvidos para isso, trazia o risco sempre presente de se perder nas viagens, algo que realmente aconteceu com muitos piolotos de aviação, inclusive alguns bem famosos. Seus aviões nunca mais foram encontrados, se perderam nesses mares sem fim. Mas nada disso parecia abalar a coragem dessas pessoas. Penso inclusive que esse filme merecia um remake nos dias atuais. Histórias assim sempre inspiram as pessoas que sonham em romper limites e barreiras de seu tempo. 

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

A Tortura do Silêncio

Outro grande clássico do mestre do suspense Alfred Hitchcock. Aqui o diretor decidiu lidar com um tema controverso, um dogma da igreja católica, o segredo da confissão. Na trama esse aspecto é muito bem explorado. Inesperadamente o empregado de uma paróquia resolve se confessar ao padre Michael Logan (Montgomery Clift) revelando que acabara de assassinar um advogado após um assalto mal sucedido. Para isso ele tinha até mesmo usado a própria batina do religioso, que havia sido roubada de seus aposentos. Como fruto de confissão, Logan agora não poderia mais contar a verdade para a polícia. O pior de tudo é que o inspetor Larrue (Karl Malden) começa a desconfiar que o próprio padre foi de fato autor do crime, afinal todas as pistas parecem apontar para seu lado, inclusive um complicado relacionamento dele com a bela Ruth Grandfort (Anne Baxter), uma mulher casada que estava sendo chantageada pelo mesmo advogado que foi morto. E agora, conseguirá o Padre Logan provar sua inocência sem romper seu juramento de nunca revelar as confissões de seus fiéis?

Provavelmente um dos mais bem elaborados filmes do mestre Alfred Hitchcock. Aqui ele coloca vários dogmas da fé católica na berlinda, ao mostrar um padre que não pode romper o segredo da confissão ao mesmo tempo em que tenta provar sua inocência em razão de um crime que nunca cometeu. Outro ponto interessante é a forma como Hitchcock lida com o celibato dos padres. Logan tem um amor em seu passado, quando era apenas um jovem prestes a ir para a guerra, justamente uma mulher casada que mesmo após tantos anos não consegue esquecer. A montagem do quebra-cabeças acaba levando o padre, um homem de grande fibra moral, ao desprezo público. Todos o consideram culpado, apenas pelo fato de ser um homem religioso que se encontrava com um antigo amor. Será que ele não merecia nem ao menos um voto de confiança? Como pode um homem tão bom e íntegro ser desacreditado assim, praticamente da noite para o dia?

O papel do torturado e existencial Padre Logan se mostra ideal para Montgomery Clift. A fragilidade física do ator, aliada a uma grande fibra espiritual, se mostra perfeita para a proposta do enredo. Há uma cena em que Hitchcock faz um paralelo muito perspicaz sobre o verdadeiro calvário que seu personagem passa. Enquanto ele anda a esmo, na rua, em profundo conflito interior por tudo o que passa, surge em primeiro plano, no alto de uma igreja, uma imagem de Cristo e os soldados romanos durante sua penosa caminhada rumo ao calvário. Um efeito até mesmo simples, mas muito significativo do mestre do suspense. A imagem funciona assim como uma materialização de tudo aquilo que o pobre padre passa naquele momento. A vivência mais plena do que é ser cristão de verdade. A acusação infundada, o abandono por parte de seus próprios fiéis, o escárnio público e a condenação sem provas consistentes.

Por falar no diretor, ele é a primeira pessoa que surge em cena, no alto de uma grande escadaria logo na abertura do filme. Hitchcock sempre fazia essas pequenas aparições em suas produções e aqui o momento é mais do que divertido. Por trás da diversão também havia um aspecto sério a se considerar. A impressão que passa é que o cineasta tentava exorcizar mais um de seus conflitos internos com o filme. Como se sabe Hitchcock tinha uma relação de amor e ódio em relação ao catolicismo, algo que aqui ele acaba passando para a tela. Ao mesmo tempo em que martiriza seu personagem principal, o padre, também o enche de muita dignidade e honestidade. O transforma em um santo perseguido. Uma cristalina imagem do que ele próprio sentia em relação à Igreja de Roma. Assim fica a recomendação desse grande trabalho do genial diretor. Fé, conflito espiritual, tentação, injustiça, mentira e hipocrisia formam o núcleo de uma trama simplesmente brilhante. Assista e entenda porque Hitchcock foi um dos maiores gênios da história do cinema.

A Tortura do Silêncio (I Confess, Estados Unidos, 1953) Estúdio: Warner Bros / Direção: Alfred Hitchcock / Roteiro: George Tabori, William Archibald / Elenco: Montgomery Clift, Anne Baxter, Karl Malden / Sinopse: Jovem padre passa a ser o principal suspeito de um crime de assassinato. Ele é inocente e sabe quem foi o verdadeiro culpado, mas não pode contar para os policiais pois esse segredo lhe foi passado em confissão, ao qual ele tem que manter sigilo por causa de um dogma de fé da igreja católica. Filme indicado no Cannes Film Festival na categoria de Melhor Direção (Alfred Hitchcock).

Pablo Aluísio. 

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Doutor Jivago

Doutor Jivago
Na Rússia czarista às vésperas da Revolução Comunista um jovem médico recém formado e poeta, Yuri Jivago (Omar Sharif), começa a entender as terríveis mudanças pelas quais a sociedade de seu país está prestes a passar. Naquele ambiente de revolta duas classes sociais estão vivendo um choque violento de ideologias. A nobreza e a alta burguesia preenchem seu tempo em festas e salões luxuosos enquanto a classe trabalhadora clama por justiça e direitos. Enquanto isso Lara (Julie Christie), uma linda garota de apenas 17 anos, começa a se tornar o objeto de desejo de um burocrata do sistema, o infame Komarovsky (Rod Steiger), mal sabendo ela que no futuro o seu destino e o do jovem Jivago se encontrarão, dando origem a um romance que tentará sobreviver a implantação de um dos regimes políticos mais brutais da história do século XX. Assim começa o grande clássico do cinema "Doutor Jivago", uma das maiores obras primas do cineasta David Lean. Com roteiro baseado no best-seller de Boris Pasternak o filme trouxe para as telas o trágico e comovente amor entre Jivago e sua eterna musa Lara. Com reconstituição histórica simplesmente perfeita e brilhante domínio técnico, o mestre David Lean deu à sétima arte mais um marco de sua carreira.

Um dos grandes méritos do texto de "Doutor Jivago" é que ele procura captar as terríveis mudanças nas vidas das pessoas comuns quando houve aquela grande ruptura dentro da sociedade russa. O que era para ser um novo regime, baseado na liberdade e distribuição de riquezas logo se tornou tão brutal e infame quanto o próprio sistema czarista que derrubou. Usando de força militar o governo dito comunista destruiu direitos individuais, violou inúmeras vezes os direitos humanos e impôs sua visão de Estado máximo com uma brutalidade poucas vezes vista na história da humanidade. Ao mostrar um jovem médico tentando sobreviver ao lado de sua família no meio daquele caos revolucionário a mensagem de Boris Pasternak se mostra cristalina. Nenhum sistema sobrevive sem respeitar o ser humano como tal. Como exposto várias vezes no filme, a ideologia comunista não admitia mais qualquer traço de individualidade, onde o homem se tornava apenas instrumento estatal sem qualquer vontade própria. Assim o personagem Jivago é tirado de sua família, de forma forçada e arbitrária, para seguir com os fanáticos partidários vermelhos ao front, onde homens morriam ao relento, no gelo do inverno russo, em combates sem sentidos ou objetivos contra o chamado exército branco.

Como havia feito em "Lawrence da Arábia" o genial David Lean usa a natureza indomável da Rússia como componente de narração criando um efeito de raro brilhantismo. Os personagens tentam de todas as formas sobreviver naquela ambiente hostil mas acabam percebendo que são apenas peças menores de um jogo de xadrez do qual não conseguem escapar. Há várias cenas grandiosas em "Dr. Jivago" que retratam justamente isso, como por exemplo, a fuga da família de Jivago rumo aos montes Urais em um trem lotado de refugiados sem quaisquer condições mínimas de assegurar a dignidade humana daquelas pessoas. A fotografia maravilhosa da região que Lean disponibiliza ao espectador realmente é de encher os olhos. Outro destaque é a forma muito terna e ao mesmo tempo realista que o diretor explora o amor impossível entre Jivago e Lara. Essa aliás é quase sempre associada a lindos campos de girassóis amarelos, onde fica clara mais uma vez o uso da beleza da natureza como componente de narração do genial Lean. A cena final de Lara, caminhando solitária rumo ao desconhecido, com um enorme e opressivo poster do ditador sanguinário Stálin ao fundo também é outro exemplo do talento do diretor em dizer muito apenas com imagens marcantes. Ali ele simboliza toda a insignificância da pessoa humana frente ao onipresente e sufocante Estado Soviético. Um toque de gênio. "Doutor Jivago" é uma obra magnífica digna de todos os elogios. Em pouco mais de três horas e meia David Lean consegue levar seu espectador para o centro da revolução comunista, mostrando todos os dramas e pesadelos pelos quais o povo russo passou naquele período histórico. Época aliás que os russos sabiamente querem mesmo é esquecer e com toda a razão do mundo.  

Doutor Jivago (Doctor Zhivago, EUA, Itália, Espanha, 1965) Direção: David Lean / Roteiro: Robert Bolt, baseado na obra de Boris Pasternak / Elenco: Omar Sharif, Julie Christie, Geraldine Chaplin, Rod Steiger, Alec Guinness, Tom Courtenay, Siobhan McKenna, Ralph Richardson / Sinopse: O filme narra os dramas de um jovem casal que tanta levar em frente seu amor em meio ao caos da Revolução Russa. Vencedor do Oscar nas categorias de Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Direção de Arte, Melhor Fotografia, Melhor Figurino e Melhor Trilha Sonora. Indicado nas categorias de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator Coadjuvante (Tom Courtenay), Melhor Edição e Melhor Som. Vencedor do Globo de Ouro nas categorias de Melhor Filme - Drama, Melhor Diretor (David Lean), Melhor Ator - Drama (Omar Sharif), Melhor Roteiro e Melhor Trilha Sonora. Vencedor do Grammy de Melhor Trilha Sonora. Indicado a Palma de Ouro em Cannes.

Pablo Aluísio. 

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Anjo Escarlate

Título no Brasil: Anjo Escarlate
Título Original: Scarlet Angel
Ano de Lançamento: 1952
País: Estados Unidos
Estúdio: Universal Pictures
Direção: Sidney Salkow
Roteiro: Oscar Brodney
Elenco: Rock Hudson, Yvonne De Carlo, Richard Denning, Whitfield Connor, Bodil Miller, Amanda Blake

Sinopse:
Nesse drama romântico o ator Rock Hudson interpreta um capitão da marinha mercante que tenta reerguer sua carreira em uma nova embarcação. Ao cruzar com uma bela bailarina de saloon ele vê a chance de acertar também em sua vida amorosa, mas antes disso terá alguns problemas a resolver enquanto tenta alcançar a felicidade. 

Comentários:
Esse filme pode ser considerado a primeira grande oportunidade de Rock Hudson em mostrar que tinha realmente chances de se tornar um astro em Hollywood. Foi o primeiro em que ele estrelou, tendo seu nome colocado em destaque no poster do filme. Antes Rock havia apenas atuado como coadjuvante, onde chegou a chamar bastante atenção ao lado de James Stewart em dois excelentes filmes de western. Nessa produção ele encontrou seu caminho. O filme era um drama romântico e ele estava excepcionalmente bem no papel de galã classe A. Seu personagem também tinha aspectos tirados de sua vida pessoal pois ele havia sido da marinha durante a segunda guerra. E para completar um quadro muito bom, ainda atuava ao lado de uma starlet em ascensão, a sedutora e caliente Yvonne De Carlo. Assim o filme tinha todos os elementos para se tornar um sucesso de bilheteria, algo que se confirmaria quando a película chegou nas telas de cinema. A carreira de Rock Hudson jamais seria a mesma depois desse sucesso cinematográfico. 

Pablo Aluísio.

quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Marcado pela Sarjeta

Título no Brasil: Marcado pela Sarjeta
Título Original: Somebody Up There Likes Me
Ano de Produção: 1956
País: Estados Unidos
Estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM)
Direção: Robert Wise
Roteiro: Ernest Lehman
Elenco: Paul Newman, Pier Angeli, Everett Sloane

Sinopse:
Em roteiro baseado na autobiografia do lutador de boxe Rocky Graziano, acompanhamos sua trajetória rumo ao sucesso no esporte, seus amores, dramas e finalmente a queda após um momento de auge e excessos em sua carreira. Filme vencedor do Oscar nas categorias de Melhor Fotografia em Preto e Branco (Joseph Ruttenberg) e Melhor Direção de Arte (Cedric Gibbons e Malcolm Brown). Indicado ainda a Melhor Edição.

Comentários:
Excelente drama esportivo estrelado por Paul Newman, em cinebiografia tocante do popular lutador de boxe Rocky Graziano. O papel havia sido escrito para ser estrelado por James Dean (embora ele não tivesse altura e porte físico suficientes para encarnar o famoso boxeador). Com sua morte a MGM ficou algum tempo em busca de um ator talentoso para encarnar Rocky nas telas. Paul Newman, que também vinha do mesmo Actors Studio de Dean, se revelou ser uma excelente opção. A estrutura do roteiro se revela perfeita em três atos, mostrando a luta de Rocky em chegar ao topo, seus excessos e sua queda, tanto no esporte como na vida. Os destaques em termos de técnica cinematográfica vão para a bela fotografia e a inspirada direção de arte (não por acaso vencedoras do Oscar). A edição também se destaca, principalmente nas cenas de luta, que imprime uma grande agilidade nas sequências. Além disso Newman consegue pela primeira vez no cinema disponibilizar ao público uma excelente atuação. Outro destaque do elenco vem com a presença da atriz Pier Angeli, o grande amor de James Dean, que se destaca em seu personagem. Em suma um belo clássico que merece ser redescoberto sempre que possível.

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Sayonara

Major da Força Aérea Americana (Marlon Brando) se apaixona por jovem japonesa e tem que enfrentar a dura disciplina militar que explicitamente proíbe tal relacionamento durante a estadia de militares americanos no Japão. Basta ler a sinopse para entender porque o ator Marlon Brando se interessou pelo papel. Sempre envolvido em causas sociais (principalmente as que envolviam preconceito racial) Brando achou que seria bastante interessante tocar em um tema polêmico ao indagar até que ponto o código de ética militar das forças armadas americanas era moralmente aceitável. Que direito tinha de determinar quem poderia ou não se envolver com os soldados e oficiais americanos? Não seria uma invasão da vida pessoal dessas pessoas? 

O fato é que mesmo com a proibição muitos militares acabavam se apaixonando pelas mulheres nativas e sofriam sanções por isso. Brando adorou o roteiro desde a primeira vez que o leu mas recusou fazer o filme até que aceitassem reescrever o trágico final original. Aceitos os seus termos o ator fez as malas e junto da equipe viajou ao distante Japão para as filmagens, que não foram fáceis. O problema é que foram na época errada do ano, uma estação muito chuvosa que atrasou absurdamente o cronograma do filme. Em suas memórias Brando relembrou que havia semanas em que não conseguiam filmar nem ao menos uma tomada sequer. Pressionado e criticado pelo estúdio o diretor Joshua Logan entrou em depressão deixando o filme totalmente à deriva nas ilhas nipônicas. Isso se refletiu no resultado final. O filme tem um corte ruim, com mais de duas horas e meia de duração. Marlon acabou atribuindo isso à falta de controle do diretor Logan que se perdeu dentro do projeto.

Apesar de todos os problemas não considero "Sayonara" um filme ruim, pelo contrário. Ele pode ser levemente disperso e com várias cenas desnecessárias mas nunca se torna banal. Há certos deslizes na produção, é verdade, como a maquiagem nada convincente de Ricardo Montalban (fazendo um personagem japonês ora vejam só!) mas isso é de certo modo apenas pontual. A atriz que faz o par romântico de Brando também nada acrescenta, pois tem o talento dramático muito limitado (de fato não seguiu carreira depois). Outro problema é que inexiste química entre ela e Brando, o que para um filme pretensamente romântico é quase um desastre completo. Enfim, para fãs de Brando o filme é obrigatório, até mesmo para vê-lo em um papel de certa forma diferenciado em sua carreira (bancando o herói romântico) mas fica a observação pois o filme poderia ser bem melhor do que realmente é.

Sayonara (Sayonara, Estados Unidos, 1957) Direção de Joshua Logan / Roteiro: Paul Osborn baseado no romance de James Michener / Elenco: Marlon Brando, Patricia Owens, Red Buttons, Miiko Taka, Ricardo Montalban / Sinopse: Major da Força Aérea Americana (Marlon Brando) se apaixona por jovem japonesa e tem que enfrentar a dura disciplina militar que explicitamente proíbe tal relacionamento durante a estadia de militares americanos no Japão.

Pablo Aluísio.